CPU do CAU/RJ diz que houve descumprimento dos preceitos legais na aprovação do projeto da tirolesa no Pão de Açúcar

Publicado no Portal do CAU-RJ

O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro (CAU/RJ), através da Comissão Especial de Política Urbana (CPU), divulga manifestação sobre o projeto de instalação de tirolesa nos Morros da Urca e do Pão de Açúcar. Para a comissão houve descumprimento dos preceitos legais na aprovação do projeto urbanístico junto à Prefeitura do Rio de Janeiro.

“A despeito de ter recebido parecer favorável dos órgãos responsáveis pela tutela do Monumento Natural dos Morros do Pão de Açúcar e da Urca – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH) e Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMAC) -, quanto á preservação das características do bem tombado, às possíveis interferências na paisagem e a supressão de espécies arbóreas, há outros aspectos igualmente relevantes que sequer foram considerados no processo de licenciamento de obras. Entre estes, o impacto ambiental e urbanístico do projeto, a necessidade do corte de rochas, e a opinião dos moradores do entorno e da coletividade de uma forma geral, uma vez tratar-se de um ícone cultural e identitário, pelo qual a cidade é reconhecida nacional e internacionalmente”, diz trecho do documento.

A CPU se demonstra negativamente surpresa ao observar que o próprio órgão licenciador do empreendimento, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação (SMDEIS), não tenha submetido o projeto à avaliação da GeoRio quanto à suscetibilidade de deslizamento, face às obras de implantação do equipamento.

Leia, abaixo, a íntegra da manifestação da CPU do CAU/RJ

MANIFESTAÇÃO SOBRE O PROJETO DE INSTALAÇÃO DE TIROLESA NO MORROS DA URCA E DO PÃO DE AÇÚCAR

A Comissão de Política Urbana (CPU) do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro (CAU/RJ), reunida no dia 28 junho de 2023, vem por meio desta manifestar-se a cerca do processo de licenciamento da tirolesa do Pão de Açúcar, que tem suscitado intensa mobilização social e calorosos debates.

Após ter analisado diversos documentos, participado de audiência pública sobre o tema – que teve lugar na Câmara Municipal no dia 13/04/23 – e ter promovido uma mesa redonda com todas as partes envolvidas, em parceria com o Clube de Engenharia – ocorrida na sede do mesmo em 23/06/23 -, a CPU considera que houve o descumprimento dos preceitos legais na aprovação do projeto urbanístico junto à Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.

A despeito de ter recebido parecer favorável dos órgãos responsáveis pela tutela do Monumento Natural dos Morros do Pão de Açúcar e da Urca – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH) e Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMAC) -, quanto á preservação das características do bem tombado, às possíveis interferências na paisagem e a supressão de espécies arbóreas, há outros aspectos igualmente relevantes que sequer foram considerados no processo de licenciamento de obras. Entre estes, o impacto ambiental e urbanístico do projeto, a necessidade do corte de rochas, e a opinião dos moradores do entorno e da coletividade de uma forma geral, uma vez tratar-se de um ícone cultural e identitário, pelo qual a cidade é reconhecida nacional e internacionalmente.

Cabe ressaltar que um monumento natural é uma Unidade de Conservação da Natureza (UCN) de Proteção Integral, assim instituída pela Lei Federal N°9.985/2000, e como tal destina-se a “manutenção dos ecossistemas livres de alterações causadas por interferência humana, admitido apenas o uso indireto dos seus atributos naturais” (Art. 2°, VI). A implantação de um equipamento composto de 4 tirolesas, com capacidade de transportar 120 pax/h, além de rampa de decolagem e passarelas suspensas já é, por si só, uma interferência humana significativa, cujo impacto se dá na própria UCN e no seu entorno, ainda mais quando se considera a expansão das 3 estações existentes, intervenções que, juntas, compõem o projeto urbanístico, o plano diretor ou masterplan, como seus autores lhe preferem denominar.

Este é, a nosso ver, um problema original que ocultou a magnitude da intervenção proposta e de seus possíveis impactos: o fato do projeto ter sido apresentado de forma fatiada e incompleto. Somente após a emissão da licença de obras, em setembro de 2022, é que foram protocoladas as solicitações de licenças para modificação com acréscimo dos imóveis correspondentes às estações da Praia Vermelha, Urca e Pão de Açúcar, totalizando mais de 6 mil m2 de acréscimo de área.  De acordo com os representantes do IPHAN e da SMAC, não havia no projeto inicialmente apresentado da tirolesa qualquer informação quanto ao corte de rochas. A autorização da GeoRio só ocorreu posteriormente ao embargo das obras pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, em fevereiro de 2023.

Não nos cabe aqui fazer conjecturas sobre as razões que levaram a empresa Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar (CCAPA) a proceder de tal forma. Entretanto, nos causa espécie que o próprio órgão licenciador – a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação (SMDEIS) – não tenha submetido o projeto à avaliação da GeoRio quanto à suscetibilidade de deslizamento, face às obras de implantação do equipamento, como, lamentavelmente, veio a ocorrer.

Igualmente surpreendente foi o fato da SMDEIS não exigir que a empresa apresentasse estudos técnicos de avaliação dos possíveis efeitos negativos e medidas mitigadoras, uma vez tratar-se de projeto urbanístico que contém interferências significativas, potencialmente modificadoras do meio ambiente natural e urbano. Os números superlativos da área e dos visitantes estimados com a implantação da nova atração turística, remetem inevitavelmente à necessidade de análise de impacto ambiental e de vizinhança, com obrigatória participação da população atingida.

Vale lembrar que a Resolução 001/86 do CONAMA, prevê justamente a obrigatoriedade de realização de Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) para “projetos urbanísticos, acima de 100 ha, ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério da SEMA e dos órgãos estaduais e municipais competentes (Art. 2°, XV). Impossível imaginar que a Prefeitura considere que a área que ela mesma declarou como Monumento Natural não tenha relevante interesse ambiental. Logo, seria mais do que adequado exigir a elaboração do EIA/RIMA por parte dos interessados.

Desta feita, sugerimos que a licença de obras concedida pela Prefeitura seja cancelada, e que seja exigido dos interessados a apresentação de estudos técnicos de avaliação de impactos. Também é recomendável que a Superintendência de Patrimônio da União seja acionada para esclarecer a situação da concessão da operação do sistema de bondes, diante da controvérsia sobre a titularidade da mesma, haja visto que a CCAPA não mais opera.

Quanto á sociedade civil, que tanto se mobilizou na defesa deste icônico patrimônio natural, cultural e identitário, é preciso que sejam criados canais de participação efetiva, para a prestação da fundamental contribuição das universidades, associações comunitárias e profissionais e organizações não governamentais, na perspectiva de sua sustentabilidade.

Esta é uma obra em um bem público de importância singular, e, portanto, ´é preciso que a `Prefeitura assuma suas responsabilidades de condução, coordenação e concertação de interesses.

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