Icomos Brasil – Nota sobre as intervenções em curso nos Morros do Pão de Açúcar e Urca no Rio de Janeiro

 

ICOMOS, o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios, é uma organização não governamental global associada à UNESCO. A sua missão é promover a conservação, a proteção, o uso e a valorização de monumentos, centros urbanos e sítios. Participa no desenvolvimento da doutrina, evolução e divulgação de ideias, e realiza ações de sensibilização e defesa. O ICOMOS é o organismo consultor do Comitê do Patrimônio Mundial para a implementação da Convenção do Patrimônio Mundial da UNESCO

 

O Comitê Brasileiro do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS-Brasil)
manifesta perplexidade e veemente repúdio com a intervenção que está em curso no Monumento Natural do Pão de Açúcar e no Morro da Urca, no Rio de Janeiro, não obstante sua proteção em várias esferas. Trata-se de um bem tombado pelo IPHAN desde 1973 (Livro Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico), Unidade de Conservação Municipal (MoNa do Pão de Açúcar e Morro da Urca) criada em 2006, e um dos componentes seriais que conforma o sítio “Paisagens Cariocas entre o Mar e a Montanha”, reconhecido como Patrimônio Mundial pela UNESCO, na tipologia Paisagem Cultural, em 2012. Além de patrimônio natural e paisagístico, o Pão de Açúcar foi recentemente reconhecido como um dos 100 mais destacados patrimônios geomorfológicos mundiais pelo International Geoscience Programme (IGCP) da Unesco, devido à singularidade da sua forma.

É notório, nacional e internacionalmente, que o Pão de Açúcar é um dos mais significativos ícones do Rio de Janeiro para os habitantes da cidade e para turistas e um dos seus mais procurados mirantes de contemplação da paisagem e é, em si, também paisagem.

A intervenção em curso para a instalação de uma tirolesa se configura como uma mutilação deste bem tombado, pela perfuração e cortes na rocha com retirada da matéria que o constitui, podendo vir a causar o aumento de fissuras e o descolamento de lascas do maciço rochoso, alterando sua forma e comprometendo sua resistência e integridade, de acordo com o parecer técnico de especialistas já publicado em notas. Tal fato contraria frontalmente os preceitos de proteção e conservação do Patrimônio Nacional instituídos pelo Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937, o qual, em seu Art. 17 estabelece que:

As coisas tombadas não poderão, em caso nenhum ser destruídas, demolidas ou mutiladas, nem, sem prévia autorização especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ser reparadas, pintadas ou restauradas.

Nesse sentido, considera-se temerária a aprovação desta intervenção sem que a empresa tenha apresentado elementos imprescindíveis à análise, como um estudo detalhado de resistência do maciço rochoso, sondagens, o detalhamento do projeto de perfuração, o volume de rocha a ser alterado/perfurado, etc.

Diante do exposto, e cumprindo sua missão de promover e garantir a conservação, proteção e valorização de monumentos e sítios, e particularmente, a autenticidade e o valor universal excepcional de bens reconhecidos como Patrimônio Mundial, o ICOMOS Brasil recomenda a imediata interdição da obra, com a anulação das licenças, bem como uma nova apreciação do mérito do Pão de Açúcar e Morro da Urca como bens tombados por seu valor natural e paisagístico, dessa vez com base na legislação de tombamento e nos potenciais riscos para o bem tombado, para além das ameaças em relação aos atributos da paisagem. Além disso, se faz necessária a recomposição da rocha nas perfurações já realizadas por meio da melhor tecnologia disponível de modo a restituir a integridade física do bem tombado.

Rio de Janeiro, 04 de abril de 2023

 

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